Este
artigo foi concebido como uma introdução geral ao ateísmo. Embora haja tentado
ser o mais neutro possível, deve-se sempre ter em mente que este documento
representa apenas um ponto de vista. Aconselho fortemente que cada um faça a
leitura no intuito de tirar conclusões próprias sobre o assunto.
A
fim de manter a coesão e um desenvolvimento linear, o artigo apresenta-se como
uma conversa imaginária entre um ateísta e um teísta. Todas as perguntas feitas
pelo teísta imaginário foram selecionadas por serem muito freqüentes nas
discussões do tipo “teístas versus ateus”.
Importante
salientar que este artigo é inclinado a abordar as questões do ponto de vista
cristão. Isso se deve ao fato de as perguntas aqui apresentadas terem sido
predominantemente feitas por cristãos.
Quando
falo “religião” me refiro primariamente ao cristianismo, judaísmo e islamismo,
as quais envolvem a crença em alguma espécie de ser divino supra-humano. Muitas
das respostas abrangerão também outras religiões, mas algumas talvez não.
O que é Ateísmo?
O
ateísmo é caracterizado pela ausência da crença na existência de quaisquer
deuses. A descrença geralmente vem de uma decisão deliberada ou de uma
dificuldade para acreditar nos ensinamentos religiosos que parecem literalmente
inverossímeis. Não se trata simplesmente da descrença advinda do
desconhecimento sobre as religiões.
Alguns
ateus vão além da mera descrença: afirmam categoricamente que não existem
deuses particulares ou quaisquer deuses. A simples descrença em deuses é
comumente denominada “ateísmo passivo”; o “ateísmo ativo” seria literalmente
acreditar que não há (ou é impossível existir) deuses.
Em
relação às pessoas que nunca tiveram contato com a idéia de “Deus”: se são
“atéias” ou não, isso é matéria para debate. Mas já que provavelmente não
encontraremos qualquer indivíduo nessa situação, promover tal debate passa a
ter pouca importância.
É
importante salientar a diferença entre os ateísmos “ativo” e “passivo”. O “ateísmo
passivo” trata-se simplesmente de ceticismo; descrença na existência de Deus. O
“ateísmo ativo” afirma positivamente a inexistência de Deus. Não cometa o
equívoco de classificar todos ateus como “ativos”. Há uma diferença qualitativa
entre as posições “ativa” e “passiva”, não se trata tão-somente de uma variação
no grau de “intensidade ateística”.
Alguns
ateus acreditam na inexistência de todos deuses; outros se limitam a deuses
específicos, como o Deus cristão, em vez de fazer negações generalizadas.
Não crer em Deus
não significa a mesma coisa que acreditar em sua inexistência?
Definitivamente,
não. Descrer significa não julgar ser verdade. Não crer que algo é verdade não
equivale à crença em sua falsidade; certos indivíduos simplesmente dizem não
saber se isso é verdade ou não, o que nos leva ao agnosticismo.
O que é
Agnosticismo?
O
termo “agnosticismo” foi cunhado pelo professor T.H. Huxley em uma reunião da
Sociedade Metafísica em 1876. Ele definiu um agnóstico como alguém que nega
tanto o “ateísmo ativo” quanto o teísmo, e também que acreditava que a questão
da existência de uma força superior não foi e nunca poderá ser resolvida. Outra
definição para agnóstico é alguém que acredita ser impossível saber com certeza
se Deus existe.
Desde
essa época, entretanto, o termo agnóstico também foi utilizado para designar
aqueles que não julgavam a questão intrinsecamente incognoscível, mas também
alegavam que as evidências contra Deus eram inconclusivas, permanecendo, então,
neutros sobre o assunto.
Para
reduzir a confusão acerca do termo “agnosticismo” recomenda-se nomear a
definição original como “agnosticismo estrito” e a segunda como “agnosticismo
empírico”.
Palavras
são traiçoeiras e a linguagem abunda em imprecisões. Mantenhamo-nos, então,
longe da idéia de podermos deduzir o ponto de vista filosófico de alguém
simplesmente baseados no fato dele denominar-se ateu ou agnóstico. Por exemplo,
muitas pessoas usam o termo agnosticismo no sentido de “ateísmo passivo” e a
palavra “ateísmo” designando “ateísmo forte”.
A
palavra “ateu” possui várias significações, e assim fica muito difícil fazer
qualquer generalização. Tudo que pode ser dito com segurança é que ateus não
crêem em Deus. Por exemplo, certamente nem todos julgam que a ciência é o
melhor método para desvendar os segredos do Universo.
O que significa a
expressão “livre-pensador”?
Um
livre-pensador é alguém que está preparado para considerar qualquer
possibilidade. Uma pessoa que determina quais idéias estão certas ou erradas
através da razão, valendo-se de um conjunto de regras consistentes, como, por
exemplo, o método científico.
Quais são as bases
ou justificativas filosóficas do ateísmo?
Há
muitas justificativas filosóficas para o ateísmo. O modo mais eficiente para
descobrir por que algum indivíduo tornou-se ateu certamente é perguntar
diretamente a ele.
Muitos
ateus acham que a idéia de Deus, tal como apresentada pelas religiões, é
autocontraditória e assim seria logicamente impossível a existência de tal
Deus. Outros são ateus devido ao ceticismo, porque não vêem evidências da
existência divina.
Obviamente,
algumas pessoas são ateístas sem qualquer justificativa muito consistente. Para
outros ser ateu é simplesmente uma questão de bom senso.
Não é impossível
provar a inexistência de algo?
Há
muitos exemplos que vão contra essa afirmação. Por exemplo, é relativamente
simples provar que não existe um número primo maior que todos os outros números
primos. É claro, estamos falando de idéias e regras bem definidas. Se Deus ou o
Universo são similarmente bem definidos é uma outra questão.
Entretanto,
admitindo por um momento que não seja impossível provar a existência de algo,
ainda há razões sutis para afirmar, a princípio, a sua inexistência. É sempre
possível provar a invalidez desta “negação por antecipação” encontrando um
contra-exemplo, ou seja, provando a existência.
Se
admitirmos que algo existe e não é impossível de ser comprovado, demonstrar a
invalidade dessa hipótese pode requerer uma exaustiva busca por todos os
lugares em que esse “algo” poderia ser encontrado, simplesmente para mostrar
que não está lá. Tal busca comumente é impraticável ou impossível. Não há esse
tipo de problema com os maiores números primos, pois podemos provar sua
inexistência matematicamente.
Desse
modo, geralmente admite-se como uma premissa sensata que nada existe até termos
evidências do contrário. Os próprios teístas seguem essas regras a maior parte
do tempo. Sabemos disso porque eles não acreditam em unicórnios, apesar de não
poderem provar conclusivamente que não existem.
Dizer
que Deus existe é fazer uma afirmação que provavelmente não estará sujeita a
testes. Não temos como promover uma busca a todos os lugares onde Deus poderia
estar para simplesmente mostrar que não está lá. O ateu cético (“ateu passivo”)
admite a inexistência de Deus apenas por ver nisso algo sensato e lógico, mas
que pode ser refutado com um contra-exemplo (ou seja, uma prova de sua
existência).
Os
que professam o “ateísmo ativo” normalmente não afirmam a inexistência de todo
e qualquer tipo de deus; em vez disso, vão geralmente restringir suas
afirmações aos deuses descritos por fiéis de várias religiões. Apesar de
provavelmente ser impossível demonstrar conclusivamente que nenhum deus existe,
talvez seja possível provar a inexistência de um deus descrito por um livro
religioso em específico. Talvez até seja possível provar que nenhuma divindade
descrita por qualquer religião contemporânea exista.
Na
prática, acreditar que nenhum dos deuses descritos pelas religiões existe está
muito próximo de acreditar que nenhum deus existe. No entanto, os
contra-argumentos baseados na impossibilidade da negação de todo tipo de
divindade não são aplicáveis neste caso.
E se Deus for essencialmente
indetectável?
Se,
de um modo qualquer, Deus interage com o Universo, os efeitos de tal interação
necessariamente implicam uma manifestação física. Logo, qualquer interação
Deus-Universo é, a princípio, detectável.
Se
Deus for essencialmente indetectável, então ele não interage com nosso Universo
em absoluto. Muitos ateus argumentariam que se Deus não interage com nosso
Universo, não faria diferença alguma se ele existe ou não.
Se
o que a Bíblia diz é verdade, Deus pode ser facilmente detectado pelos
Israelitas; certamente deveria ser ainda hoje, mas por que a situação mudou?
Não
estou dizendo que Deus precisa manifestar-se em ambientes controlados e
situações cientificamente verificáveis. Alguma revelação, alguma experiência
direta com Deus: isso seria incomunicável e não sujeito à verificação
científica, mas, ainda assim, seria muito convincente.
Através
de uma revelação direta ou da observação certamente deveria ser possível
perceber alguns efeitos da presença divina; caso contrário, como poderíamos
distingui-la de todas as outras coisas que não existem?
Deus é único. É um
ser supremo. É o criador do Universo. Existe por definição.
As
coisas não existem meramente porque foram definidas. Conhecemos muito bem o
exemplo do papai Noel. Sabemos qual é sua aparência, o que ele faz, onde vive,
os nomes de suas renas, e assim por diante. Infelizmente, isso não prova a
existência do papai Noel.
E se eu provasse
logicamente que Deus existe?
Antes
de se engajar nessa tentativa você deve explicitar claramente significado da
palavra “Deus”. Uma prova lógica requer uma definição clara do que se está
tentando provar.
Mas todos sabem o
que “Deus” significa.
Religiões
diferentes tem concepções diferentes sobre o que é “Deus”; chegam mesmo a
entrar em desacordo sobre coisas primárias como, por exemplo, quantos deuses
existem, se é homem ou mulher, e assim por diante. Para um ateu a palavra
“Deus” pode ter um significado muito distinto do que tem para você.
Se eu definir o que
quero dizer com “Deus” e depois provar logicamente que ele existe, isso seria
suficiente?
Mesmo
com séculos de esforços ninguém conseguiu provar a existência de Deus. Apesar
disso, as pessoas geralmente acham que podem provar logicamente a existência de
Deus.
Infelizmente,
a realidade não é regrada puramente pela lógica. Mesmo provando com uma
rigorosa lógica formal que Deus existe, isso não seria de grande valia. Pode
acontecer de as leis da lógica não preservarem a verdade fielmente. Assim,
mesmo um sistema rigorosamente lógico ainda pode ser falho. Talvez o erro
esteja nas premissas; talvez a realidade não seja logicamente previsível. No
fim, o único modo descobrir como as coisas realmente são é observando e/ou
testando experimentalmente. A lógica serve meramente para termos idéia de onde
ou como promover uma investigação, e mesmo os argumentos mais lógicos sobre a
existência de Deus não dão margem a isso.
A
lógica é uma ferramenta útil para analisar e inferir o que está acontecendo;
mas se a lógica e a realidade entrarem em desacordo, a realidade vence.
Parece-me que nada
vai convencê-lo da existência de Deus.
Uma
definição precisa do significado do termo “Deus” e a apresentação de algumas
provas contundentes e objetivas suportando tal teoria seria o suficiente para
convencer muitos ateus.
A
prova deve ser clara; evidências anedóticas baseadas em experiências religiosas
de terceiros não são suficientes. Uma evidência consistente e objetiva é
necessária porque afirmar a existência de Deus é uma alegação extraordinária e,
deste modo, requer evidências extraordinárias para sustentar-se.
Você acha que tem uma justifica filosófica para o ateísmo, mas ela não
equivale uma crença religiosa?
Um
dos passatempos mais comuns na filosofia é o “jogo da redefinição”. A seguir
está um exemplo da visão cínica desse jogo.
Uma
pessoa A começa fazendo uma afirmação duvidosa. Quando a
pessoa B mostra que aquilo não pode ser verdade, a pessoa A
redefine gradualmente as palavras utilizadas na afirmação até chegar a algo que
a pessoa B esteja preparada para aceitar. Ele então repete a
afirmação para confirmar que a pessoa B está em concordância.
O indivíduo A continua a argumentar tomando como pressuposto
que os dois estão em acordo com a afirmação nova, mas A usa as
definições antigas das palavras (que B não aceitou) em vez de
as redefinições novas necessárias para convencer B. Apesar da
inconsistência, B tende a dar-lhe razão.
O
objetivo dessa digressão é responder que a questão “o ateísmo é uma crença
religiosa?” depende diretamente do que a palavra “religião” significa.
“Religião” é geralmente caracterizada por uma crença em uma força sobre-humana
– especialmente algum tipo de Deus –, algum tipo de fé e adoração. Alguns tipos
de budismo não podem ser considerados “religiões” tomando por base essa
definição.
O
ateísmo certamente não é uma crença em qualquer espécie de poder supra-humano e
também não é caracterizado pela adoração em qualquer sentido relevante. Ampliar
a definição de “religião” o suficiente para abarcar o ateísmo faria com que
muitos outros aspectos do comportamento humano repentinamente se tornassem
“religiosos” – como a ciência, política e a televisão.
Talvez não seja uma religião no sentido mais estrito da palavra, mas
certamente a crença no ateísmo (ou ciência) é um ato de fé, como na religião.
Em primeiro lugar, não algo
é muito claro se o ateísmo cético é algo em que se crê.
Em
segundo, é preciso adotar um certo número de premissas para embasar as
explicações de nossas experiências sensoriais. A maioria dos ateus adotará o
mínimo de premissas possível; e até as poucas adotadas sempre estarão sujeitas
à experimentação caso haja dúvida sobre sua veracidade.
A
ciência tem um certo número de premissas. Por exemplo, é geralmente aceito que
as leis da física são as mesmas para todos os observadores (ao menos para todos
que estão no mesmo sistema inercial). Esses são os tipos de suposições que os
ateus fazem. Se idéias básicas como essas podem ser denominadas “atos de fé”,
então quase todo nosso conhecimento deve ser encarado como fé, e o termo acaba por
perder seu sentido.
A
palavra “fé” é mais comumente utilizada no sentido de completar algo em que se
acredita. De acordo com tal definição, o ateísmo e a ciência certamente não
podem ser classificados como “atos de fé”. É claro, indivíduos ateus ou cientistas
podem vir a ser tão dogmáticos quanto os religiosos ao afirmarem que possuem
“certeza absoluta” sobre algo. Entretanto, essa não é uma tendência muito
comum. Alguns ateus se mostram relutantes até para afirmar que o Universo
existe.
A
fé também é usada para justificar crenças sem a necessidade de evidências ou
provas. O ateísmo cético certamente não cabe nessa definição, pois não possui
crenças. O ateísmo ativo está mais próximo disso, mas ainda não pode ser
classificado como tal, já que até o ateu mais dogmático ainda apresenta a
tendência de argumentar com base em dados experimentais (ou falta desses dados)
quando estiver defendendo a inexistência de Deus.
Se o ateísmo não é
uma religião, certamente é contra elas.
Uma
infeliz tendência humana é rotular todos sem meio-termo, “a favor” ou “contra”,
“amigo” ou “inimigo”; as coisas não são simples assim.
O
ateísmo é uma posição que, logicamente, opõe-se ao teísmo; neste contexto pode
ser denominado como “anti-religião”. Entretanto, quando os religiosos falam que
ateus são essencialmente “anti-religião”, costumam deixar a impressão de que há
uma espécie de antipatia ou ódio aos teístas.
Tachar
os ateus como hostis à religião é relativamente injusto. As atitudes dos ateus
em relação aos teístas cobrem um grande espectro.
A
maioria dos ateus toma uma posição de “viva e deixe viver”. Se não forem
questionados a respeito provavelmente nem chegam a mencionar suas opiniões,
senão talvez a amigos íntimos. É possível que isso se deva, em parte, ao
ateísmo não ser “socialmente aceitável” em muitos países.
Poucos são os ateus que se
mostram efetivamente contra a religião, procurando até converter outros quando
possível. Historicamente, tais grupos ateus e anti-religião tem tido pouca
influência na sociedade, salvo nos países do Bloco ocidental.
Uma
pequena digressão: A União Soviética dedicou-se, originalmente, à separação
entre a Igreja e o Estado, assim como os EUA. Os cidadãos soviéticos eram
legalmente livres para professar a crença que desejassem. A instituição do “ateísmo
estatal” surgiu quando Stalin tomou o poder da União Soviética e tentou
destruir todas as igrejas a fim de obter poder absoluto sobre a população.
Alguns
ateus tornam-se bastante comunicativos em relação às suas crenças quando vêem a
religião intrometer-se em assuntos que não lhe dizem respeito. Por exemplo, o
governo dos EUA. Tais indivíduos costumam ser ativamente favoráveis à separação
da Igreja e o Estado.
Impedir que a religião opine sobre o funcionamento do estado não
corresponde a um “ateísmo estatal”?
O
princípio da separação entre a Igreja e o Estado diz apenas que o Estado não
deve legislar assuntos concernentes à crença religiosa. Isso significa não
apenas que o Estado não pode promover uma religião em detrimento de outra, mas
que também não pode promover qualquer crença de natureza religiosa.
As
religiões ainda podem opinar em assuntos puramente seculares. Por exemplo,
religiosos foram historicamente responsáveis pelo encorajamento às reformas
políticas. Mesmo hoje, muitas organizações que defendem um aumento nas verbas
para ajudar países estrangeiros têm fundamento religioso. Desde que apenas
tratem de assuntos seculares e não usem a religião como fator discriminatório,
a maioria dos ateus sente-se satisfeita em ver que eles têm liberdade para
professar suas crenças.
E as rezas nas
escolas? Se não há Deus, por que você se importa com isso?
Porque
pessoas que rezam também votam e são legisladoras; elas possuem uma tendência a
fazer coisas que os que não rezam simplesmente não podem ignorar. Rezas cristãs
em escolas são constrangedoras para os não-cristãos, mesmo se for dada a
liberdade para não participarem.
A
grande diversidade de crenças religiosas e não-religiosas implica a
impossibilidade de formular uma reza que abarque toda essa variedade a ponto de
tornar-la aceitável para todos indistintamente.
Esse
é um motivo pelo qual nos EUA não é permitido que escolas públicas apóiem
certos tipos de crença através de rezas religiosas. As crianças são, é claro,
livres para rezar, se desejarem, em seu tempo vago; não há, neste caso, motivos
para querer evitar que isso aconteça nas escolas.
Você mencionou a
campanha cristã em favor da ajuda a países estrangeiros. E os ateus? Por que
não há ateus visitando hospitais ou fazendo caridades? Eles são contra as
caridades religiosas?
Há
muitas caridades voluntárias e sem motivos religiosos que ateus fazem. Alguns
contribuem para caridades religiosas também, pois no fim o que importa para
eles é o bem que fazem. Outros até trabalham voluntariamente em movimentos que
tiveram início por motivos religiosos.
A
maioria dos ateus acha que conciliar sua descrença à sua caridade não é
possível nem importante. Para eles o ateísmo é algo trivial e, de modo
equivalente, também a caridade. Muitos acham que é baixo, para não dizer
hipócrita, usar a caridade como uma desculpa para promover um conjunto de
crenças religiosas.
Para
ateus “passivos” construir um hospital e dedicá-lo à sua descrença em Deus é
uma idéia muito estranha; seria como dar uma festa e dizer “hoje não é meu
aniversário”. O ateísmo raramente é espalhafatoso.
Você disse que o ateísmo não é anti-religião. Ele não seria, talvez, uma
resistência à formação educacional, uma espécie de rebeldia?
Talvez
para alguns, mas muitas pessoas têm pais que não tentam incutir-lhes idéias
sobre religião, e muitos desses pais denominam-se ateus.
Sem
dúvida há os casos de religiosos que usam a crença como desculpa para lutar
contra a difusão do ateísmo, mas apenas querem sentir-se “especiais”. Em
contrapartida, muitas pessoas vêem a religião como um modo de estar em
conformidade às expectativas dos outros.
No
fim, não fica muito nítido se o ateísmo ou a religião são um subterfúgio ou
conformismo; mas vale lembrar que, em geral, as pessoas têm a tendência a agir
em grupo em vez de pensar independentemente.
Qual a diferença
entre ateus e pessoas religiosas?Ateus não crêem em Deus. A princípio isso é tudo que pode ser dito com certeza.
Ateus
podem ouvir heavy metal – de trás para frente também – ou então preferir um
réquiem de Verdi, mesmo que conheçam as letras. Podem usar camisetas havaianas,
se vestir todos de preto ou mesmo usar mantos alaranjados (muitos budistas não
crêem em divindades). Alguns ateus até carregam uma Bíblia consigo (para
argumentar contra, é claro).
Seja
você quem for, provavelmente já encontrou vários ateus sem aperceber-se disso.
Eles são, geralmente, pessoas de comportamento e aparência comuns.
Mas os ateus não
são menos morais que pessoas religiosas?
Isso
depende. Se a “moralidade” é medida pela obediência a Deus, claro que ateus são
menos morais, pois não obedecem a deus algum. Normalmente, quando alguém fala
de moralidade, se refere ao que é “aceitável” ou “inaceitável” em relação a
comportamentos em sociedade.
Humanos
são animais sociais, e para utilizarem seus potenciais plenamente devem
cooperar uns com os outros. Esse é um motivo bom o suficiente para que um ateu
não se torne “anti-social” ou “imoral”.
Muitos
ateus são “morais” ou “compassivos” simplesmente porque esta é uma tendência
natural neles. O porquê dos ateus se importarem com os outros eles não sabem
explicar; simplesmente são assim naturalmente.
Obviamente,
há os que se comportam imoralmente e tentam usar o ateísmo como justificativa.
Entretanto, há igual número de pessoas que se comportam de modo idêntico e
tentam usar como justificativa suas crenças religiosas. Por exemplo:
“Este
é um dito confiável que merece aceitação total: Jesus Cristo veio ao mundo para
salvar pecadores… por esse motivo, foi-me demonstrada misericórdia, para que em
mim… Jesus pudesse manifestar sua paciência ilimitada como uma prova de que
todos os que nele crêem terão a vida eterna. Para o rei eterno, imortal,
invisível e único, sejam, a honra e a glória, eternas.”
A
citação acima foi feita numa corte no dia 17 de fevereiro de 1992 por Jeffrey
Dahmer, um notório Serial-killer canibal de Milwaukee, Wisconsin. Parece que
para cada assassinato em nome do ateísmo, há outro em nome da religião.
Os ateus não
gostariam de acreditar em Deus?
Ateus
vivem suas vidas como se ninguém os estivesse observando, e muitos deles não
gostam da idéia de serem permanentemente observados, não importando quão
“bem-intencionadas” sejam as intenções de Deus.
Alguns
ateus gostariam de acreditar em Deus, mas o que isso prova? As pessoas devem
admitir coisas como sendo verdadeiras simplesmente porque assim desejam? Os
riscos de tal atitude são óbvios. A maioria dos ateus tem consciência de que
querer crer não é suficiente: deve haver, também, um motivo.
É claro que os ateus não vêem evidências a favor da existência de Deus,
pois, no fundo de suas almas, eles não querem ver.
Muitos
ateus, senão a maioria, eram anteriormente religiosos. Como explicado acima, a
grande maioria deles já considerou seriamente a possibilidade da existência de
Deus. Muitos ateus passaram tempo rezando e tentando “encontrar” Deus.
Claro
que alguns ateus não possuem uma mente aberta, mas inferir a partir disso que
todos ateus sejam preconceituosos e desonestos é, em si mesma, uma atitude
ofensiva e que só poderia vir de outra mente fechada. Entretanto, argumentos do
tipo “é claro que Deus está lá, você apenas não está sabendo procurar” são
comumente encarados como fanáticos.
Certamente,
se você deseja engajar-se numa discussão filosófica com ateus, é de vital
importância aceitar possibilidade da dúvida em relação à existência de Deus e
admitir que eles estejam sendo sinceros quando dizem que realmente já
procuraram por Deus, mas sem obter sucesso. Se você não consegue aceitar que
eles estejam sendo sinceros ao se dizerem ateus, então qualquer tentativa de
promover um debate eficiente será vã.
A vida não é sem
sentido para um ateu?
Muitos
ateus têm uma vida com sentido. Eles inserem, através do que pensam, um sentido
na vida, e lutam para conquistar seus objetivos. Fazem suas vidas valerem a
pena, não esperando por uma recompensa no além, mas trabalhando para que sua
influência repercuta nas pessoas futuras. Por exemplo, um ateu pode dedicar sua
vida a reformas políticas na esperança de deixar sua marca na história.
É
uma tendência natural no ser humano procurar por um “significado” ou
“propósito” em eventos esporádicos. Entretanto, não está muito claro se a
“vida” é o tipo de coisa que tem um “sentido” em si mesmo.
Colocando
de outro modo, nem tudo que se apresenta na forma de um questionamento é
verdadeiramente algo sensato de ser perguntado. Alguns ateus consideram a
questão “qual o sentido da vida?” uma coisa tola como perguntar “qual o
significado de um copo de café?”. Eles acreditam que a vida não tem propósito
ou significado, simplesmente existe.
Onde os ateus
encontram conforto em tempos de perigo?Há muitos modos para se obter conforto:
– Família e amigos
– Animais de estimação
– Comida e bebida
– Música, televisão
– Literatura, artes e entretenimento
– Esportes ou exercícios
– Meditação
– Psicoterapia
– Drogas
– Trabalho
Isso
pode parecer um modo vazio e vulnerável de encarar o perigo, mas e daí? Os
indivíduos devem acreditar em coisas porque são confortantes ou aceitar a realidade
não importando quão dura seja?
No
fim, a decisão é de casa um. A maioria dos ateus não é capaz de acreditar em
algo meramente porque isso os conforta. Eles primam pela verdade antes do
conforto. A busca pela verdade é, por vezes, fruto de tristeza e frustração, e
freqüentemente a verdade machuca.
Os ateus não se
preocupam com a possibilidade de estarem enganados?A resposta é: “não, e você?”
Muitos
indivíduos são ateus há bastante tempo. Já se depararam com muitos argumentos e
supostas “evidências” da existência de Deus, mas julgaram-nas todas inválidas
ou inconclusivas.
Religiões
existentes há milhares de anos não foram capazes de obter qualquer prova da
existência de Deus. Assim, os ateus tendem a considerar muito improvável que
alguém prove que estão errados, e por isso simplesmente não se preocupam com
tal possibilidade.
Então porque os teístas devem questionar suas crenças? Os mesmos
argumentos não se aplicam?
Não,
porque as crenças sendo questionas não são similares. O “ateísmo passivo” é a
“posição cética padrão” a ser tomada; ele não afirma nada. “Ateísmo ativo” é
uma crença negativa. O teísmo, por sua vez, é uma crença positiva muito forte.
Os
ateus às vezes argumentam que os teístas deveriam questionar suas crenças
devido ao dano que podem causar (não apenas aos crentes, mas a todos ao seu
redor).
Que tipo de dano?
A
religião representa uma gigantesca despesa para a humanidade. Não é apenas
questão de crentes desperdiçarem seu dinheiro na construção de igrejas; pense
em todo o tempo e esforços gastos na construção dessas igrejas, e também nas
rezas. Imagine quantos objetivos existem nos quais esse esforço poderia ser
mais bem empregado.
Muitos
teístas acreditam em curas milagrosas. Há muitos casos de pessoas doentes que
após serem “curadas” por um padre deixam de tomar os remédios prescritos pelos
médicos e acabam morrendo. Alguns teístas morreram porque se negaram a receber,
por motivos religiosos, transfusões sangüíneas.
É
muito provável que a posição da Igreja Católica em relação ao controle de
natalidade – em particular as camisinhas – agrave ainda mais o problema da
superpopulação em muitos dos países de terceiro muito e ainda contribua na
disseminação da aids.
Alguns
religiosos tornaram-se notórios por assassinar seus filhos em vez de deixá-los
tornarem-se ateus ou casarem-se com alguém de uma religião diferente. Vários
líderes religiosos sabidamente justificaram assassinatos tomando a “blasfêmia”
como argumento.
Houve
muitas guerras religiosas. Mesmo admitindo que a religião não seja a verdadeira
causa dessas guerras, foi eficientemente usada como justificativa.
Eles não eram
crentes verdadeiros. Só diziam ser.Essa parece a falácia “nenhum escocês de verdade…”
O
que é um crente verdadeiro? O que faz de alguém um crente verdadeiro? Há tantas
crenças alegando serem “a verdadeira” que é difícil saber. Olhemos o cristianismo:
há muitos grupos competindo entre si, todos convictos de serem os únicos
verdadeiros. Por vezes até lutam e matam uns aos outros. Como um ateu poderia
discernir qual o “verdadeiro” cristão quando nem as maiores igrejas cristãs
como a Igreja Católica e a Igreja Inglesa conseguem entrar em acordo entre elas
mesmas?
No
fim, muitos ateus tomam uma posição pragmática e decidem que todo indivíduo que
se denomina cristão e usa as crenças ou dogmas cristãos para justificar suas
ações deve ser considerado um cristão. Talvez alguns cristãos estejam
simplesmente pervertendo os ensinamentos de Cristo para seus próprios fins;
mas, certamente, se a Bíblia pode ser usada tão facilmente para justificar atos
acristãos, não pode ser encarada como um código moral muito consistente. Se a
Bíblia é a palavra de Deus, por que ele não a fez com menos margem para
distorções? E como você pode saber se a sua visão não é uma perversão das
intenções divinas?
Não
há uma interpretação “pura” e “definitiva” da Bíblia, então por que um ateu
deveria adotar uma interpretação específica em detrimento de outra? Baseados no
fato de você se auto-intitular correto? Se alguém alega crer em Jesus e
assassina aos outros porque na Bíblia estava escrito para assim proceder,
indistintamente também devemos classificá-lo como um indivíduo cristão.
Obviamente os extremos da crença devem ser questionados. Mas já que
ninguém provou a inexistência de Deus, deve ser muito improvável que as crenças
mais fundamentais, as compartilhadas de todas as religiões, sejam sem sentido.
Os
aspectos básicos que as crenças religiosas possuem em comum dificilmente serão
surpreendentes se você perceber que a religião é um produto da sociedade. A
partir desse ponto de vista, as religiões apenas tomaram emprestado idéias que
contribuem para a estabilidade de uma sociedade, como o respeito à autoridade,
a proibição do assassinado, e assim por diante.
Ademais,
alguns aspectos compartilhados pelas religiões têm sido reciclados de religiões
anteriores. Por exemplo, é possível que os Dez Mandamentos do Velho Testamento
tenham sido baseados no Código de Hamurabi.
Afirmar
que algo, por não ter sido desmentido, tem menos chances de ser sem sentido, é
absurdo. Como mostrado anteriormente, afirmações categóricas concernentes à
existência (positivas) de entidades são inerentemente mais difíceis de
desmentir que as afirmações negativas. Ninguém jamais provou que unicórnios não
existem, e há muitas histórias sobre eles, mas nem por isso os unicórnios
deixaram de ser mitos.
É
muito mais coerente admitir a inexistência das coisas até termos motivos do
contrário. No entanto, a maioria dos “ateus passivos” diria que não afirmar
nada é ainda melhor.
Se o ateísmo é tão
bom assim, porque há tantos teístas?
Infelizmente,
a popularidade de uma crença não tem muita relação com sua veracidade;
considere quantas pessoas acreditam em astrologia, grafologia e outras
pseudociências.
Muitos
ateus acham que crer em Deus é simplesmente sinal de fraqueza. Certamente, em
sociedades primitivas, a religião permitia aos indivíduos lidar com fenômenos
que não podiam compreender adequadamente.
É
claro que a religião é mais que isso. Em nosso mundo industrializado
encontramos pessoas acreditando em explicações sobrenaturais para fenômenos que
possuem explicações perfeitamente naturais e coerentes. A religião pode ter
começado com a intenção de explicar o mundo, mas hoje em dia também tem outros
propósitos. Por exemplo, para muitas pessoas a religião possui uma função
social, provendo uma sensação de comunidade e congregação.
Muitas culturas
desenvolveram religiões. Isso não significa nada para você?
Na
realidade não. A maioria só possui semelhanças superficiais; por exemplo, vale
lembrar que religiões como o Budismo e o Taoísmo não possuem qualquer conceito
de Deus no sentido cristão. Em suma, não há consenso entre os religiosos sobre
o que Deus realmente seja. Logo, um dos problemas a serem solucionados antes de
travar uma discussão sobre Deus com um ateu é explicar exatamente o que você
quer dizer com esta palavra.
A
maioria das religiões é bem diligente em denunciar os problemas de suas rivais,
por isso não faz muito sentido usar uma religião para justificar outra.
E todos os cientistas e filósofos que chegaram à conclusão de que Deus
existe?
Em
primeiro lugar, pesquisas tipicamente chegam à conclusão de que 40% dos
cientistas acreditam em Deus; ou seja, os crentes são uma minoria.
Para
cada cientista ou filósofo que acredita em Deus, há outro que não. Além disso,
como já demonstrado acima, a veracidade de uma crença não é determinada pela
quantidade de seguidores que possui. Também é importante salientar que os ateus
não vêem os cientistas famosos ou filósofos como os religiosos vêem seus
líderes.
Um
cientista famoso é apenas um humano; ele pode ser especialista em alguns
campos, mas quando estiver falando de outros assuntos suas palavras não
possuirão qualquer relevância além das de outra pessoa qualquer. Muitos cientistas
respeitáveis acabaram passando vergonha ao falarem sobre assuntos que fugiam
das suas áreas de especialidade.
Até
os cientistas famosos são tratados com ceticismo pela comunidade científica.
Cientistas muito experientes em seus campos também devem prover evidências para
corroborar suas teorias; a ciência apóia-se em resultados reproduzíveis e
confirmáveis independentemente. Teorias novas que sejam incompatíveis com o
conhecimento científico existente serão submetidas a um escrutínio ainda mais
rigoroso; mas se as novas teorias se mostrarem verdadeiras e os resultados que
levaram a essa conclusão forem reproduzíveis, então as novas teorias tomarão o
lugar das antigas.
Por
exemplo, a mecânica quântica e a teoria da relatividade são altamente
controversas; foi necessário deitar por terra muitas teorias científicas para
sustentá-las. Ainda assim, ambas foram aceitas prontamente após uma grande
variedade e quantidade de experimentos terem confirmado sua veracidade. Teorias
pseudocientíficas como o criacionismo não são rejeitadas por serem
controversas, mas porque simplesmente não estão sujeitas a qualquer
investigação científica.
Então para você o
crescimento das religiões não indica nada?
Não
totalmente. Certamente indica que a religião em questão tem propriedades ajudam
em sua difusão.
A
teoria memética fala sobre os “memes”, conjuntos de idéias que se propagam na
mente humana por analogia com os genes. Alguns ateus vêem a religião como um
conjunto bem-sucedido de memes parasitários que encorajam seus “hospedeiros” a
converter outros indivíduos. Alguns memes evitam sua autodestruição
desencorajando o questionamento da crença pelos fiéis ou, usando semelhante
pressão, evitam que ex-crentes admitam abertamente que estavam errados. Alguns
memes religiosos até mesmo encorajam seus “hospedeiros” a destruir os
possuidores de memes diferentes.
É
claro que na visão memética não há qualquer “virtude” associada com a
propagação em larga escala. O número de seguidores que uma religião possui é
tão significativo para considera-la como “boa” quanto uma doença é “boa” ou
“ruim” em função do número de pessoas que infecta.
Entretanto,
a abordagem memética do assunto não tem muito a dizer sobre a “veracidade” da
informação contida nos memes.
Mesmo se a religião não for totalmente verdadeira, ela traz importantes
mensagens. Quais são as mensagens fundamentais do ateísmo?
Há
várias mensagens importantes que o ateísmo promove. A seguir estão apenas
algumas delas; não se surpreenda se algumas das idéias abaixo também forem
encontradas em religiões.
–
O comportamento moral não é simplesmente seguir regras resignadamente.
– Devemos ser céticos,
especialmente com asserções positivas (que afirmam a existência de algo).
–
Se você quer que sua vida tenha algum sentido, cabe a você encontrá-lo.
–
Primar pela verdade, mesmo que não seja agradável.
–
Se quisermos mudar, mudemos-nos a nós mesmos. Não devemos esperar a ação de
“poderes externos”.
–
A popularidade de algo não implica que esse algo é bom.
–
Se você quer defender algo, defenda o que estiver sujeito à comprovação
experimental.
–
Não creia em coisas simplesmente porque você “gostaria que fossem assim”.
…e o mais importante:
– Todas crenças devem estar abertas ao questionamento.
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